Caros
alunos,
Um Projeto de Vida é um plano colocado em papel para que possamos
visualizar melhor os caminhos que devemos seguir para alcançar nossos objetivos.
Desse modo, necessitamos saber claramente quais são eles e ter em mente também
quais são os nossos valores, pois são eles que nortearão nossas escolhas. Isso é
fundamental para viver em harmonia com o que realmente nosso coração pede,
pois, na ausência de um Projeto de Vida, corremos o risco de ficar sem direção.
Dessa forma, conhecer-se, saber o que a vida realmente significa para
você e conhecer seus valores são de fundamental importância no planejamento do
seu Projeto de Vida. É através dele que você poderá se desenvolver melhor e
realizar os seus sonhos. Lembre-se: nada é estático, e você precisa estar em
constante evolução.
Quando estamos impedidos, ainda que forçosamente e temporariamente, de
darmos continuidade e seguirmos em frente com o nosso Projeto de Vida, tendemos
a nos entregar a uma visão pessimista e distorcida da vida, porque ela nos foge
ao controle e à realização. Há uma interrupção e obstáculo que nos impede de
seguir adiante. As perspectivas do que é ou não é, dos nossos limites de pensar
e agir, nos empurra para uma inércia, da qual só sairão aqueles que resistirem
e continuarem sonhando.
Para garantir a continuidade dos estudos
nesse momento de distanciamento social, suspensão das aulas presenciais e, a
fim de darmos continuidade ao Nosso Projeto de Vida, segue algumas atividades
para organizarem seus estudos diários.
Dicas:
Ø Neste contexto,
proponho que realizem a sequência de atividades com empenho e dedicação.
Ø Para isso, é
fundamental ter organização.
Ø Mantenha-se em dia
com os estudos e sucesso na aprendizagem!!!
Ø Registre todas as
atividades no seu “DIÁRIO DE PRÁTICAS E
VIVÊNCIAS”.
Ø Coloque as datas nas atividades realizadas, pois conseguirá
se organizar.
Bom retorno!!
Atividade 1 - Leia os textos a seguir:
No meio
do caminho – Carlos Drummond de Andrade
No meio do caminho tinha uma
pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse
acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra
En Revista de Antropofagia,
1928. Incluido en Alguma poesia (1930)
O caminho é este
tem pedra, tem sol
tem bandido, mocinho
tem você amando
tem você sozinho
é só escolher
ou vai, ou fica.
Fui.
tem pedra, tem sol
tem bandido, mocinho
tem você amando
tem você sozinho
é só escolher
ou vai, ou fica.
Fui.
MEDEIROS,
M. Poesia Reunida. Porto Alegre: L&PM, 1999.
Recompensa
"No
mesmo instante em que recebemos pedras em nosso caminho, flores estão sendo
plantadas mais longe. Quem desiste não as vê."
Voltaire disse que os sonhos e a
esperança nos foram dados como compensação às dificuldades da vida. Mas
precisamos de compreender que os sonhos não são desejos superficiais. Os sonhos
são bússolas do coração, são projetos de vida. Os desejos não suportam o calor
das dificuldades. Os sonhos resistem às mais altas temperaturas dos problemas.
Renovam a esperança quando o mundo desaba sobre nós.
Voltaire
– Sonhos
Atividade 2: Biografia - Escrever a própria trajetória de
vida, de acordo com o que se pede;
Objetivo: conhecer a si próprio;
Desenvolvimento:
1.
Biografia é a história da vida de uma pessoa. A palavra tem
origem nos temos gregos bios, que significa “vida”, e graphein,
que significa “escrever”. Sabendo, então, que uma biografia é a descrição dos
fatos particulares da vida de uma pessoa, incluindo sua trajetória, escreva a
sua autobiografia no “DIÁRIO DE PRÁTICAS
E VIVÊNCIAS”, incluindo as seguintes informações:
a)
Data de nascimento:
b)
Local onde nasceu e vive atualmente:
c)
Onde estudou/estuda:
d)
Algumas habilidades específicas:
e)
Um pensamento em que realmente acredite:
f)
Algo sobre a sua família:
g) Com uma palavra o que quer ser.
Atividade 3: Retrato Falado
Objetivo: Perceber a imagem que criamos sobre nós
mesmos.
Desenvolvimento
Nessa atividade você vai reproduzir o retrato falado de algum parente, amigo
ou colega da sua turma. Assim, pegue uma
folha do seu caderno de artes (desenho) com uma prancheta. Logo em seguida, peça
a um amigo, parente ou colega de sua turma (narrador), que detalhem um rosto conhecido,
de forma que você identifique quem é.
Primeiro
Momento:
O narrador deve descrever as características
físicas, de acordo com as dicas abaixo:
1º
passo: Faça linhas básicas
que definam o contorno do rosto e maxilar;
2º
passo: Defina as
sobrancelhas e o corte e tipo do cabelo;
3º
passo: Depois os lábios,
o nariz, os olhos e as orelhas;
4º
passo: Em seguida,
caso seja, coloque barba, pintas, rugas, óculos, etc.
5º
passo: Por último, faça
perguntas precisas sobre a pessoa, como: estatura, peso, cor e personalidade.
Agora
responda no “DIÁRIO DE PRÁTICAS DE VIVÊNCIAS”:
Para você, o que foi mais difícil
retratar? Por quê?
Dica:
Aprenda a fazer
retrato falado utilizando o Pimp the Face, um site em inglês que permite
criar o desenho de um rosto a partir de uma foto ou de modelos preestabelecidos
disponíveis no site. Para aprender é só acessar:
http://www.tecmundo.com.br/imagem/4021-aprenda-a-fazer-um-retrato-falado.htm#ixzz2fiiuyr2h.
Acesso em abril. 2020.
Quando conseguir finalizar seu desenho, cole-o no seu “DÁRIO DE PRÁTICAS E VIVÊNCIAS” com a
data de reprodução, pois será compartilhado com a turma, quando retornarmos às
aulas presenciais e responda:
Para você, o que foi
mais difícil retratar? Por quê?
Segundo
momento: Leitura do
conto “O Espelho” de João Guimarães Rosa (ver o texto completo nos anexos).
Resumo: O conto O Espelho é o centro da obra
Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa. Este (o autor) utiliza uma narrativa em
primeira pessoa em contato direto com o leitor como um diálogo constante, em
que este é chamado a adentrar no mundo paralelo, na viagem extraordinária a
qual é chamado pelo viajante. Trata-se de uma narrativa que investiga a fundo a
alma humana. O narrador conta a sua experiência de olhar para um espelho e,
inicialmente, não se reconhecer, sentir repulsa da imagem que vê e, depois, só
depois, perceber que se tratava de sua própria imagem.
Importante:
tenha à mão um
dicionário para melhor entendimento do vocabulário
Após
a leitura do conto:
REFLITA:
A
percepção que temos sobre nós mesmos, muitas vezes, pode ser totalmente
diferente daquela que os outros têm de nós e isso está relacionado à nossa autoestima
e às dificuldades de aceitação. Em caso
de dúvidas sobre quem somos e o que queremos ser, é sempre bom contar com mais
de uma visão ou o apoio de alguém conhecido.
Há mais pontos positivos em nós mesmos
do que pensamos existir, sendo normal ter certas inseguranças, mas que nunca
podemos fazer disso algo que nos impeça de ser feliz. Assim como, não devemos
mascarar quem somos por medo daquilo que as outras pessoas vão pensar sobre nós.
Agora,
responda no “DIÁRIO DE PRÁTICAS E VIVÊNCIAS” com
a data de leitura:
1.
Foco
narrativo
2.
Personagens
e suas características
3.
Tempo
e espaço da narrativa
4.
Sequência
narrativa:
a)
Situação
inicial;
b)
Conflito;
c)
Clímax;
d)
Desfecho.
5.
De
acordo com conto “O Espelho”, você concorda que muitas vezes construímos uma
imagem distorcida sobre nós mesmos? Por que você acha que isso acontece?
Atividade
4 – Assistir ao filme
"Nenhum a Menos" de Zhang Yimou (ver
link nos anexos)
Objetivo
– Refletir sobre a
nossa importância no espaço em que ocupamos e a nossa relaçao com o outro.
Desenvolvimento
Nessa atividade você vai refletir e responder questões como: o nosso
papel na sociedade e no mundo, adaptação às mudanças, acontecimentos inesperados,
aprendizado, persistência, etc... Assim,
assista ao filme atentamente e extraia o máximo de informações que puder. Depois,
responda às questões no seu “DIÁRIO DE
PRÁTICAS E VIVÊNCIAS”.
Sinopse
do filme: “Nenhum a Menos” revela
as condições da educação na zona rural chinesa. O diretor flagra uma escola
primária em estado precário, na remota aldeia de Shuiquan, na qual os recursos
são tão reduzidos que seu titular, Gao, é obrigado a reservar um giz para cada
dia letivo.
Quando sua mãe adoece, o professor é
obrigado a se retirar por algum tempo, com o objetivo de visitá-la, pois está à
beira da morte. O prefeito da pequena localidade, porém, não consegue encontrar
um substituto que aceite trabalhar nestas condições. Só lhe resta contratar a
única voluntária, Wei Minzhi, de apenas 13 anos, que mal tem recursos
intelectuais para transmitir aos alunos. Na verdade, ela mesma só cursou o
primário. A garota deverá permanecer por um mês na escola, a qual será também
sua morada temporária, compartilhada com mais alguns estudantes.
Embora desprovida de qualquer
experiência, ela revela ter, apesar de sua aparente timidez crônica, uma persistência
e uma fibra surpreendentes. Mais que lhe orientar quanto ao que deve passar de conteúdo
para seus alunos, o Professor Gao lhe reserva uma árdua missão. Preocupado com
a constante evasão escolar, ele lhe recomenda que mantenha todos os estudantes
na escola, e não deixe nenhum partir.
Obcecada com esta ideia, ela faz tudo
para impedir que uma de suas alunas, talentosa atleta, seja levada para a
cidade, onde treinará para aperfeiçoar seu dom. Impotente diante desta
realidade, ela não permitirá que nenhum outro estudante parta da pequena
escola. A realidade, porém, transcende seus modestos planos, e ameaça retirar
de sua pequena comunidade mais um aluno.
Fonte: https://www.infoescola.com/cinema/nenhum-a-menos/
Acesso em 25/04/2020
Agora responda no “DIÁRIO DE VIVÊNCIAS E PRÁTICAS”:
1.
Você
acredita que os alunos só mudam de comportamento quando são desafiados a
resolver uma ação prática, um problema real? Justifique sua resposta
2.
Que
tipo de vínculo você tem com a escola e os professores? você gosta da escola
como sua própria casa?
3.
Sonhamos
com a educação de “nenhum a menos” porque ela aborda a Cidadania e a Ética,
temas que devem ser discutidos em todo o
trabalho educativo dentro e fora da sala de aula e, nos encaminham à construção
de uma sociedade mais fraterna justa e democrática. Mas o que temos feito para
ela? E você, o que você, tem feito?
4.
Você
acredita que, é possível pelo filme refletir, através da postura da professora
de enfrentar o prefeito e as dificuldades que aparecem a ela, termos
transformações importantes de melhorias para a educação?
5.
Que
relação (comparação) você faz com a escola e a atitude dos alunos do filme e a
sua escola? Escreva, no mínimo, 10 (dez linhas).
Avaliação:
Certifique-se de ter
lido as orientações para realizar cada atividade.
Valor: 10 pontos cada atividade
ANEXOS
CONTO
“O ESPELHO”
João Guimarães Rosa
Se quer seguir-me, narro-lhe; não uma
aventura, mas experiência, a que me induziram, alternadamente, séries de
raciocínios e intuições. Tomou-me tempo, desânimos, esforços. Dela me prezo,
sem vangloriar-me. Surpreendo-me, porém, um tanto à-parte de todos, penetrando
conhecimento que os outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que sabe
e estuda, suponho nem tenha idéia do que seja na verdade — um
espelho? Demais, decerto, das noções de física, com que se familiarizou,
as leis da óptica. Reporto-me ao transcendente. Tudo,
aliás, é a ponta de um mistério. Inclusive, os fatos. Ou a ausência deles.
Duvida? Quando nada acontece, há um milagre que não estamos vendo.
Fixemo-nos no concreto. O espelho, são
muitos, captando-lhe as feições; todos refletem-lhe o rosto, e o senhor
crê-se com aspecto próprio e praticamente imudado, do qual lhe dão imagem fiel.
Mas — que espelho? Há-os «bons» e «maus», os que favorecem e os que
detraem; e os que são apenas honestos, pois não. E onde situar o nível e
ponto dessa honestidade ou fidedignidade? Como é que o senhor, eu, os restantes
próximos, somos, no visível? O senhor dirá: as fotografias o comprovam.
Respondo: que, além de prevalecerem para as lentes das máquinas objeções
análogas, seus resultados apóiam antes que desmentem a minha tese, tanto
revelam superporem-se aos dados iconográficos os índices do misterioso. Ainda que tirados de imediato um após
outro, os retratos sempre serão entre si muito diferentes. Se nunca
atentou nisso, é porque vivemos, de modo incorrigível, distraídos das
coisas mais importantes. E as máscaras, moldadas nos rostos? Valem, grosso
modo, para o falquejo das formas, não para o explodir da expressão, o
dinamismo fisionômico. Não se esqueça, é de fenômenos sutis que estamos
tratando.
Resta-lhe argumento: qualquer pessoa
pode, a um tempo, ver o rosto de outra e sua reflexão no espelho. Sem
sofisma, refuto-o. O experimento, por sinal ainda não realizado com rigor,
careceria de valor científico, em vista das irredutíveis deformações, de
ordem psicológica. Tente, aliás, fazê-lo, e terá notáveis surpresas. Além
de que a simultaneidade torna-se impossível, no fluir de valores
instantâneos. Ah, o tempo é o mágico de
todas as traições… E os próprios olhos, de cada um de nós, padecem
viciação de origem, defeitos com que cresceram e a que se afizeram, mais e
mais. Por começo, a criancinha vê os objetos invertidos, daí seu desajeitado
tactear; só a pouco e pouco é que consegue retificar, sobre a postura dos
volumes externos, uma precária visão. Subsistem, porém, outras pechas, e
mais graves. Os olhos, por enquanto, são a porta do engano; duvide deles, dos
seus, não de mim. Ah, meu amigo, a espécie humana peleja para impor ao
latejante mundo um pouco de rotina e lógica, mas algo ou alguém de tudo
faz frincha para rir-se da gente… E então?
Note que meus reparos limitam-se ao
capítulo dos espelhos planos, de uso comum. E os demais — côncavos,
convexos, parabólicos — além da possibilidade de outros, não descobertos,
apenas, ainda? Um espelho, por
exemplo, tetra ou quadridimensional? Parece-me não absurda, a hipótese.
Matemáticos especializados, depois de mental adestramento, vieram a
construir objetos a quatro dimensões, para isso utilizando pequenos cubos,
de várias cores, como esses com que os meninos brincam. Duvida?
Vejo que começa a descontar um pouco de
sua inicial desconfiança, quanto ao meu são juízo. Fiquemos, porém, no
terra-a-terra. Rimo-nos, nas barracas de diversões, daqueles caricatos
espelhos, que nos reduzem a mostrengos, esticados ou globosos. Mas, se só
usamos os planos — e nas curvas de um bule tem-se sofrível espelho convexo, e numa colher
brunida um côncavo razoável — deve-se a que primeiro a humanidade mirou-se
nas superfícies de água quieta, lagoas, lameiros, fontes, delas aprendendo a
fazer tais utensílios de metal ou cristal. Tirésias, contudo, já havia
predito ao belo Narciso que ele viveria apenas enquanto a si mesmo não se
visse… Sim, são para se ter medo, os espelhos.
Temi-os, desde menino, por instintiva
suspeita. Também os animais negam-se a encará-los, salvo as críveis
excepções. Sou do interior, o senhor também; na nossa terra, diz-se que nunca
se deve olhar em espelho às horas mortas da noite, estando-se sozinho.
Porque, neles, às vezes, em lugar de nossa imagem, assombra-nos alguma
outra e medonha visão. Sou, porém, positivo, um racional, piso o chão a pés e
patas. Satisfazer-me com fantásticas não-explicações? — jamais. Que
amedrontadora visão seria então aquela? Quem o Monstro?
Sendo
talvez meu medo a revivescência de impressões atávicas? O espelho inspirava
receio supersticioso aos primitivos, aqueles povos com a idéia de que o
reflexo de uma pessoa fosse a alma. Via de regra, sabe-o o senhor, é a
superstição fecundo ponto de partida para a pesquisa. A alma do espelho —
anote-a — esplêndida metáfora. Outros, aliás, identificavam a alma com a
sombra do corpo; e não lhe terá escapado a polarização: luz—treva. Não se
costumava tapar os espelhos, ou voltá-los contra a parede, quando
morria alguém da casa? Se, além de os utilizarem nos manejos da magia,
imitativa ou simpática, videntes serviam-se deles, como da bola de
cristal, vislumbrando em seu campo esboços de futuros fatos, não será porque,
através dos espelhos, parece que o tempo muda de direção e de velocidade?
Alongo-me, porém. Contava-lhe…
Foi num lavatório de edifício público,
por acaso. Eu era moço, comigo contente, vaidoso. Descuidado, avistei…
Explico-lhe: dois espelhos — um de parede, o outro de porta lateral, aberta em
ângulo propício — faziam jogo. E o que enxerguei, por instante, foi uma
figura, perfil humano, desagradável ao derradeiro grau, repulsivo senão
hediondo. Deu-me náusea, aquele homem, causava-me ódio e susto,
eriçamento, espavor. E era — logo descobri… era eu, mesmo! O senhor acha
que eu algum dia ia esquecer essa revelação? Desde aí, comecei a
procurar-me — ao eu por detrás de mim — à tona dos espelhos, em sua lisa, funda
lâmina, em seu lume frio. Isso, que se saiba, antes ninguém tentara. Quem se
olha em espelho, o faz partindo de preconceito afetivo, de um mais ou menos
falaz pressuposto: ninguém se acha na verdade feio: quando muito, em
certos momentos, desgostamo-nos por provisoriamente discrepantes de um ideal
estético já aceito. Sou claro? O que se busca, então, é verificar,
acertar, trabalhar um modelo subjetivo, preexistente; enfim, ampliar o
ilusório, mediante sucessivas novas capas de ilusão. Eu, porém, era um
perquiridor imparcial, neutro absolutamente. O caçador de meu próprio
aspecto formal, movido por curiosidade, quando não impessoal, desinteressada;
para não dizer o urgir científico. Levei meses.
Sim, instrutivos. Operava com toda a
sorte de astúcias: o rapidíssimo relance, os golpes de esguelha, a longa
obliqüidade apurada, as contra-surpresas, a finta de pálpebras, a tocaia com a
luz de-repente acesa, os ângulos variados incessantemente. Sobretudo, uma
inembotável paciência. Mirava-me, também, em marcados momentos — de ira,
medo, orgulho abatido ou dilatado, extrema alegria ou tristeza. Sobreabriam-se-me enigmas. Se, por
exemplo, em estado de ódio, o senhor enfrenta objetivamente a sua imagem, o
ódio reflui e recrudesce, em tremendas multiplicações: e o senhor vê,
então, que, de fato, só se odeia é a si mesmo. Olhos contra os olhos.
Soube-o: os olhos da gente não têm fim. Só eles paravam imutáveis, no centro do
segredo. Se é que de mim não zombassem, para lá de uma máscara. Porque, o
resto, o rosto, mudava permanentemente. O senhor, como os demais, não vê
que seu rosto é apenas um movimento deceptivo, constante. Não vê, porque
mal advertido, avezado; diria eu: ainda adormecido, sem desenvolver sequer
as mais necessárias novas percepções.
Não vê, como também não se vêem, no
comum, os movimentos translativo e rotatório deste planeta Terra,
sobre que os seus e os meus pés assentam. Se quiser, não me desculpe; mas
o senhor me compreende.
Sendo assim,
necessitava eu de transverberar o embuço, a travisagem daquela máscara, a fito
de devassar o núcleo dessa nebulosa — a minha vera forma. Tinha de haver
um jeito. Meditei-o. Assistiram-me seguras
inspirações.
Concluí
que, interpenetrando-se no disfarce do rosto externo diversas componentes, meu
problema seria o de submetê-las a um bloqueio “visual” ou anulamento
perceptivo, a suspensão de uma por uma, desde as mais rudimentares,
grosseiras, ou de inferior significado. Tomei o elemento animal, para começo.
Parecer-se cada um de nós com
determinado bicho, relembrar seu facies, é fato. Constato-o, apenas; longe
de mim puxar à bimbalha temas de metempsicose ou teorias biogenéticas. De um mestre,
aliás, na ciência de Lavater, eu me inteirara no assunto. Que acha? Com
caras e cabeças ovinas ou eqüinas, por exemplo, bastalhe relancear a
multidão ou atentar nos conhecidos, para reconhecer que os há, muitos. Meu
sósia inferior na escala era, porém — a onça. Confirmei-me disso. E,
então, eu teria que, após dissociá-los meticulosamente, aprender a não
ver, no espelho, os traços que em mim recordavam o grande felino. Atirei-me a
tanto.
Releve-me não detalhar o método ou
métodos de que me vali, e que revezavam a mais buscante análise e o
estrênuo vigor de abstração. Mesmo as etapas preparatórias dariam para aterrar
a quem menos pronto ao árduo. Como todo homem culto, o senhor não
desconhece a Ioga, e já a terá praticado, quando não seja, em suas mais
elementares técnicas. E, os “exercícios espirituais” dos jesuítas, sei de
filósofos e pensadores incréus que os cultivam, para aprofundarem-se na
capacidade de concentração, de par com a imaginação criadora… Enfim,
não lhe oculto haver recorrido a meios um tanto empíricos: gradações de
luzes, lâmpadas coloridas, pomadas fosforescentes na obscuridade. Só a uma
expediência me recusei, por medíocre senão falseadora, a de
empregar outras substâncias no aço e estanhagem dos espelhos. Mas, era
principalmente no modus de focar, na visão parcialmente alheada, que eu
tinha de agilitar-me: olhar não-vendo.. Sem ver o que, em meu rosto, não
passava de reliquat
bestial. Ia-o conseguindo?
Saiba que eu perseguia uma realidade
experimental, não uma hipótese imaginária. E digo-lhe que nessa operação
fazia reais progressos. Pouco a pouco, no campo-de-vista do espelho, minha
figura reproduzia-se-me lacunar, com atenuadas, quase apagadas de todo,
aquelas partes excrescentes. Prossegui. Já aí, porém, decidindome a tratar
simultaneamente as outras componentes, contingentes e ilusivas. Assim, o
elemento hereditário — as parecenças com os pais e avós — que são também,
nos nossos rostos, um lastro evolutivo residual. Ah, meu amigo, nem no ovo
o pinto está intacto. E, em seguida, o que se deveria ao contágio das paixões,
manifestadas ou latentes, o que ressaltava das desordenadas pressões
psicológicas transitórias. E, ainda, o que, em nossas caras, materializa
idéias e sugestões de outrem; e os efêmeros interesses, sem seqüência nem antecedência,
sem conexões nem fundura. Careceríamos de dias, para explicar-lhe. Prefiro
que tome minhas afirmações por seu valor nominal.
À medida que trabalhava com maior
mestria, no excluir, abstrair e abstrar, meu esquema
perspectivo clivava-se, em forma meândrica, a modos de couve-flor ou bucho
de boi, e em mosaicos, e francamente cavernoso, como uma esponja. E
escurecia-se. Por aí, não obstante os cuidados com a saúde, comecei a sofrer dores
de cabeça. Será que me acovardei, sem menos? Perdoe-me, o senhor, o
constrangimento, ao ter de mudar de tom para confidência tão humana, em
nota de fraqueza inesperada e indigna. Lembre-se, porém, de Terêncio. Sim,
os antigos; acudiu-me que representavam justamente com um espelho, rodeado de
uma serpente, a Prudência, como divindade alegórica. De golpe, abandonei a
investigação. Deixei, mesmo, por meses, de me olhar em qualquer espelho.
Mas, com o comum correr quotidiano, a
gente se aquieta, esquece-se de muito. O tempo, em longo trecho, é sempre
tranqüilo. E pode ser, não menos, que encoberta curiosidade me picasse. Um dia…
Desculpe-me, não viso a efeitos de ficcionista, inflectindo de propósito,
em agudo, as situações. Simplesmente lhe digo que me olhei num espelho e
não me vi. Não vi nada. Só o campo, liso, às vácuas, aberto como o sol,
água limpíssima, à dispersão da luz, tapadamente tudo. Eu não tinha
formas, rosto? Apalpei-me, em muito. Mas, o invisto. O ficto. O sem
evidência física. Eu era — o transparente contemplador?… Tirei-me. Aturdi-me, a
ponto de me deixar cair numa poltrona.
Com que, então, durante aqueles meses de
repouso, a faculdade, antes buscada, por si em mim se exercitara! Para
sempre? Voltei a querer encarar-me. Nada. E, o que tomadamente me estarreceu:
eu não via os meus olhos. No brilhante e polido nada, não se me espelhavam
nem eles!
Tanto dito que, partindo para uma figura
gradualmente simplificada, despojara-me, ao termo, até à total desfigura.
E a terrível conclusão: não haveria em mim uma existência central, pessoal,
autônoma? Seria eu um… desalmado? Então, o que se me fingia de um suposto
eu, não era mais que, sobre a persistência do animal, um pouco de herança,
de soltos instintos, energia passional estranha, um entrecruzar-se de
influências, e tudo o mais que na impermanência se indefine? Diziam-me
isso os raios luminosos e a face vazia do espelho — com
rigorosa infidelidade. E, seria assim, com todos? Seríamos não muito mais
que as crianças — o espírito do viver não passando de ímpetos
espasmódicos, relampejados entre miragens: a esperança e a memória.
Mas, o senhor estará achando que
desvario e desoriento-me, confundindo o físico, o hiperfísico e
o transfísico, fora do menor equilíbrio de raciocínio ou alinhamento
lógico — na conta agora caio. Estará pensando que, do que eu disse, nada
se acerta, nada prova nada. Mesmo que tudo fosse verdade, não seria
mais que reles obsessão auto-sugestiva, e o despropósito de pretender que
psiquismo ou alma se retratassem em espelho…
Dou-lhe razão. Há, porém, que sou um mau
contador, precipitando-me às ilações antes dos fatos, e, pois: pondo os
bois atrás do carro e os chifres depois dos bois. Releve-me. E deixe que o
final de meu capítulo traga luzes ao até agora aventado, canhestra e
antecipadamente.
São sucessos muito de
ordem íntima, de caráter assaz esquisito. Narro-os, sob palavra, sob
segredo. Pejo-me. Tenho de demais resumi-los.
Pois foi que, mais tarde, anos, ao fim
de uma ocasião de sofrimentos grandes, de novo me defrontei — não rosto a
rosto. O espelho mostrou-me. Ouça. Por um certo tempo, nada enxerguei. Só
então, só depois: o tênue começo de um quanto como uma luz, que se
nublava, aos poucos tentando-se em débil cintilação, radiância. Seu mínimo
ondear comovia-me, ou já estaria contido em minha emoção? Que luzinha, aquela,
que de mim se emitia, para deter-se acolá, refletida, surpresa? Se quiser,
infira o senhor mesmo.
São coisas que se não devem
entrever; pelo menos, além de um tanto. São outras coisas, conforme
pude distinguir, muito mais tarde — por último — num espelho. Por aí,
perdoe-me o detalhe, eu já amava — já aprendendo, isto seja, a
conformidade e a alegria. E… Sim, vi, a mim mesmo, de novo, meu rosto, um
rosto; não este, que o senhor razoavelmente me atribui. Mas o
ainda-nem-rosto — quase delineado, apenas — mal emergindo, qual uma flor
pelágica, de nascimento abissal… E era não mais que: rostinho de menino, de
menosque-menino, só. Só. Será que o senhor nunca compreenderá?
Devia ou não devia
contar-lhe, por motivos de talvez. Do que digo, descubro, deduzo. Será, se?
Apalpo o evidente? Tresbusco. Será este nosso desengonço e mundo o plano —
intersecção de planos — onde se completam de fazer as almas?
Se sim, a “vida” consiste em experiência
extrema e séria; sua técnica — ou pelo menos parte — exigindo o consciente
alijamento, o despojamento, de tudo o que obstrui o crescer da alma, o que a
atulha e soterra? Depois, o “salto mortale”… — digo-o, do jeito, não
porque os acrobatas italianos o aviventaram, mas por precisarem de toque e
timbre novos as comuns expressões, amortecidas… E o julgamento-problema,
podendo sobrevir com a simples pergunta: — “Você chegou a existir?”
Sim? Mas, então, está irremediavelmente
destruída a concepção de vivermos em agradável acaso, sem razão nenhuma,
num vale de bobagens? Disse. Se me permite, espero, agora, sua opinião, mesma,
do senhor, sobre tanto assunto. Solicito os reparos que se digne dar-me, a
mim, servo do senhor, recente amigo, mas companheiro no amor da ciência,
de seus transviados acertos e de seus esbarros titubeados. Sim?
ROSA, Guimarães. Primeiras Estórias. DOWNLOAD EBOOK (Nova Fronteira, 2014, epub)
Filme “Nenhum a Menos”:
https://www.youtube.com/watch?v=WWGj0gXzoD4
(legendado)
Bom Estudo!!!
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