sexta-feira, 27 de março de 2020

3ª Série do Ensino Médio - Língua Portuguesa - Profª Elaine Cristina

3ª Série do Ensino Médio
Atividades de Língua Portuguesa
Professora Elaine Cristina

ATIVIDADE DE LINGUA PORTUGUESA EM CARÁTER EXTRAORDINÁRIO - 1º BIMESTRE/20

Atividade 1 – Conto: Leitura, análise e interpretação

Leia o conto a seguir:
O espelho
Esboço de uma nova teoria da alma humana
       Quatro ou cinco cavalheiros debatiam, uma noite, várias questões de alta transcendência, sem que a disparidade dos votos trouxesse a menor alteração aos espíritos. A casa ficava no morro de Santa Teresa, a sala era pequena, alumiada a velas, cuja luz fundia-se misteriosamente com o luar que vinha de fora.   Entre a cidade, com as suas agitações e aventuras, e o céu, em que as estrelas pestanejavam, através de uma atmosfera límpida e sossegada, estavam os nossos quatro ou cinco investigadores de coisas metafísicas, resolvendo amigavelmente os mais árduos problemas do universo.
       Por que quatro ou cinco? Rigorosamente eram quatro os que falavam; mas, além deles, havia na sala um quinto personagem, calado, pensando, cochilando, cuja espórtula no debate não passava de um ou outro resmungo de aprovação. Esse homem tinha a mesma idade dos companheiros, entre quarenta e cinqüenta anos, era provinciano, capitalista, inteligente, não sem instrução, e, ao que parece, astuto e cáustico. Não discutia nunca; e defendia-se da abstenção com um paradoxo, dizendo que a discussão é a forma polida do instinto batalhador, que jaz no homem, como uma herança bestial; e acrescentava que os serafins e os querubins não controvertiam nada, e, aliás, eram a perfeição espiritual e eterna. Como desse esta mesma resposta naquela noite, contestou-lha um dos presentes, e desafiou-o a demonstrar o que dizia, se era capaz. Jacobina (assim se chamava ele) refletiu um instante, e respondeu:
       - Pensando bem, talvez o senhor tenha razão.
       Vai senão quando, no meio da noite, sucedeu que este casmurro usou da palavra, e não dois ou três minutos, mas trinta ou quarenta. A conversa, em seus meandros, veio a cair na natureza da alma, ponto que dividiu radicalmente os quatro amigos. Cada cabeça, cada sentença; não só o acordo, mas a mesma discussão tornou-se difícil, senão impossível, pela multiplicidade das questões que se deduziram do tronco principal e um pouco, talvez, pela inconsistência dos pareceres. Um dos argumentadores pediu ao Jacobina alguma opinião, - uma conjetura, ao menos.
       - Nem conjetura, nem opinião, redargüiu ele; uma ou outra pode dar lugar a dissentimento, e, como sabem, eu não discuto. Mas, se querem ouvir-me calados, posso contar-lhes um caso de minha vida, em que ressalta a mais clara demonstração acerca da matéria de que se trata. Em primeiro lugar, não há uma só alma, há duas...
       - Duas?
       - Nada menos de duas almas. Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para entro... Espantem-se à vontade, podem ficar de boca aberta, dar de ombros, tudo; não admito réplica. Se me replicarem, acabo o charuto e vou dormir. A alma exterior pode ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto, uma operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma exterior de uma pessoa; - e assim também a polca, o voltarete, um livro, uma máquina, um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc. Está claro que o ofício dessa segunda alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja. Quem perde uma das metades, perde naturalmente metade da existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior implica a da existência inteira. Shylock, por exemplo. A alma exterior aquele judeu eram os seus ducados; perdê-los equivalia a morrer. "Nunca mais verei o meu ouro, diz ele a Tubal; é um punhal que me enterras no coração." Vejam bem esta frase; a perda dos ducados, alma exterior, era a morte para ele. Agora, é preciso saber que a alma exterior não é sempre a mesma...
       - Não?
       - Não, senhor; muda de natureza e de estado. Não aludo a certas almas absorventes, como a pátria, com a qual disse o Camões que morria, e o poder, que foi a alma exterior de César e de Cromwell. São almas enérgicas e exclusivas; mas há outras, embora enérgicas, de natureza mudável. Há cavalheiros, por exemplo, cuja alma exterior, nos primeiros anos, foi um chocalho ou um cavalinho de pau, e mais tarde uma provedoria de irmandade, suponhamos. Pela minha parte, conheço uma senhora, - na verdade, gentilíssima, - que muda de alma exterior cinco, seis vezes por ano. Durante a estação lírica é a ópera; cessando a estação, a alma exterior substitui-se por outra: um concerto, um baile do Cassino, a rua do Ouvidor, Petrópolis...
       - Perdão; essa senhora quem é?
       - Essa senhora é parenta do diabo, e tem o mesmo nome; chama-se Legião... E assim outros mais casos. Eu mesmo tenho experimentado dessas trocas. Não as relato, porque iria longe; restrinjo-me ao episódio de que lhes falei. Um episódio dos meus vinte e cinco anos...
       Os quatro companheiros, ansiosos de ouvir o caso prometido, esqueceram a controvérsia.
       Santa curiosidade! tu não és só a alma da civilização, és também o pomo da concórdia, fruta divina, de outro sabor que não aquele pomo da mitologia. A sala, até há pouco ruidosa de física e metafísica, é agora um mar morto; todos os olhos estão no Jacobina, que conserta a ponta do charuto, recolhendo as memórias. Eis aqui como ele começou a narração:
       - Tinha vinte e cinco anos, era pobre, e acabava de ser nomeado alferes da Guarda Nacional. Não imaginam o acontecimento que isto foi em nossa casa. Minha mãe ficou tão orgulhosa! tão contente!  Chamava-me o seu alferes. Primos e tios, foi tudo uma alegria sincera e pura. Na vila, note-se bem, houve alguns despeitados; choro e ranger de dentes, como na Escritura; e o motivo não foi outro senão que o posto tinha muitos candidatos e que esses perderam. Suponho também que uma parte do desgosto foi inteiramente gratuita: nasceu da simples distinção. Lembra-me de alguns rapazes, que se davam comigo, e passaram a olhar-me de revés, durante algum tempo. Em compensação, tive muitas pessoas que ficaram satisfeitas com a nomeação; e a prova é que todo o fardamento me foi dado por amigos... Vai então uma das minhas tias, D. Marcolina, viúva do Capitão Peçanha, que morava a muitas léguas da vila, num sítio escuso e solitário, desejou ver-me, e pediu que fosse ter com ela e levasse a farda. Fui, acompanhado de um pajem, que daí a dias tornou à vila, porque a tia Marcolina, apenas me pilhou no sítio, escreveu a minha mãe dizendo que não me soltava antes de um mês, pelo menos. E abraçava-me! Chamava-me também o seu alferes. Achava-me um rapagão bonito. Como era um tanto patusca, chegou a confessar que tinha inveja da moça que houvesse de ser minha mulher. Jurava que em toda a província
não havia outro que me pusesse o pé adiante. E sempre alferes; era alferes para cá, alferes para lá, alferes a toda a hora. Eu pedia-lhe que me chamasse Joãozinho, como dantes; e ela abanava a cabeça, bradando que não, que era o "senhor alferes". Um cunhado dela, irmão do finado Peçanha, que ali morava, não me chamava de outra maneira. Era o "senhor alferes", não por gracejo, mas a sério, e à vista dos escravos, que naturalmente foram pelo mesmo caminho. Na mesa tinha eu o melhor lugar, e era o primeiro servido. Não imaginam. Se lhes disser que o entusiasmo da tia Marcolina chegou ao ponto de mandar pôr no meu quarto um grande espelho, obra rica e magnífica, que destoava do resto da casa, cuja mobília era modesta e simples... Era um espelho que lhe dera a madrinha, e que esta herdara da mãe, que o comprara a uma das fidalgas vindas em 1808 com a corte de D. João VI. Não sei o que havia nisso de verdade; era a tradição. O espelho estava naturalmente muito velho; mas via-se-lhe ainda o ouro, comido em parte pelo tempo, uns delfins esculpidos nos ângulos superiores da moldura, uns enfeites de madrepérola e outros caprichos do artista. Tudo velho, mas bom...
       - Espelho grande?
       - Grande. E foi, como digo, uma enorme fineza, porque o espelho estava na sala; era a melhor peça da casa. Mas não houve forças que a demovessem do propósito; respondia que não fazia falta, que era só por algumas semanas, e finalmente que o "senhor alferes" merecia muito mais. O certo é que todas essas coisas, carinhos, atenções, obséquios, fizeram em mim uma transformação, que o natural sentimento da mocidade ajudou e completou. Imaginam, creio eu?
       - Não.
- O alferes eliminou o homem. Durante alguns dias as duas naturezas equilibraram-se; mas não tardou que a primitiva cedesse à outra; ficou-me uma parte mínima de humanidade.
       Aconteceu então que a alma exterior, que era dantes o sol, o ar, o campo, os olhos das moças, mudou de natureza, e passou a ser a cortesia e os rapapés da casa, tudo o que me falava do posto, nada do que me falava do homem. A única parte do cidadão que ficou comigo foi aquela que entendia com o exercício da patente; a outra dispersou-se no ar e no passado. Custa-lhes acreditar, não?
       - Custa-me até entender, respondeu um dos ouvintes.
       - Vai entender. Os fatos explicarão melhor os sentimentos: os fatos são tudo. A melhor definição do amor não vale um beijo de moça namorada; e, se bem me lembro, um filósofo antigo demonstrou o movimento andando. Vamos aos fatos. Vamos ver como, ao tempo em que a consciência do homem se obliterava, a do alferes tornava-se viva e intensa. As dores humanas, as alegrias humanas, se eram só isso, mal obtinham de mim uma compaixão apática ou um sorriso de favor. No fim de três semanas, era outro, totalmente outro. Era exclusivamente alferes. Ora, um dia recebeu a tia Marcolina uma notícia grave; uma de suas filhas, casada com um lavrador residente dali a cinco léguas, estava mal e à morte.
       Adeus, sobrinho! adeus, alferes! Era mãe extremosa, armou logo uma viagem, pediu ao cunhado que fosse com ela, e a mim que tomasse conta do sítio. Creio que, se não fosse a aflição, disporia o contrário; deixaria o cunhado e iria comigo. Mas o certo é que fiquei só, com os poucos escravos da casa. Confesso-lhes que desde logo senti uma grande opressão, alguma coisa semelhante ao efeito de quatro paredes de um cárcere, subitamente levantadas em torno de mim. Era a alma exterior que se reduzia; estava agora limitada a alguns espíritos boçais. O alferes continuava a dominar em mim, embora a vida fosse menos intensa, e a consciência mais débil. Os escravos punham uma nota de humildade nas suas cortesias, que de certa maneira compensava a afeição dos parentes e a intimidade doméstica interrompida. Notei mesmo, naquela noite, que eles redobravam de respeito, de alegria, de protestos. Nhô alferes, de minuto a minuto; nhô alferes é muito bonito; nhô alferes há de ser coronel; nhô alferes há de casar com moça bonita, filha de general; um concerto de louvores e profecias, que me deixou extático. Ah ! pérfidos! mal podia eu suspeitar a intenção secreta dos malvados.
       - Matá-lo?
       - Antes assim fosse.
       - Coisa pior?
       - Ouçam-me. Na manhã seguinte achei-me só. Os velhacos, seduzidos por outros, ou de movimento próprio, tinham resolvido fugir durante a noite; e assim fizeram. Achei-me só, sem mais ninguém, entre quatro paredes, diante do terreiro deserto e da roça abandonada.
       Nenhum fôlego humano. Corri a casa toda, a senzala, tudo; ninguém, um molequinho que fosse.   Galos e galinhas tão-somente, um par de mulas, que filosofavam a vida, sacudindo as moscas, e três bois.   Os mesmos cães foram levados pelos escravos. Nenhum ente humano.
       Parece-lhes que isto era melhor do que ter morrido? era pior. Não por medo; juro-lhes que não tinha medo; era um pouco atrevidinho, tanto que não senti nada, durante as primeiras horas. Fiquei triste por causa do dano causado à tia Marcolina; fiquei também um pouco perplexo, não sabendo se devia ir ter com ela, para lhe dar a triste notícia, ou ficar tomando conta da casa. Adotei o segundo alvitre, para não desamparar a casa, e porque, se a minha prima enferma estava mal, eu ia somente aumentar a dor da mãe, sem remédio nenhum; finalmente, esperei que o irmão do tio Peçanha voltasse naquele dia ou no outro, visto que tinha saído havia já trinta e seis horas. Mas a manhã passou sem vestígio dele; à tarde comecei a sentir a sensação como de pessoa que houvesse perdido toda a ação nervosa, e não tivesse consciência da ação muscular. O irmão do tio Peçanha não voltou nesse dia, nem no outro, nem em toda aquela semana. Minha solidão tomou proporções enormes.
       Nunca os dias foram mais compridos, nunca o sol abrasou a terra com uma obstinação mais cansativa. As horas batiam de século a século no velho relógio da sala, cuja pêndula tic-tac, tic-tac, feria-me a alma interior, como um piparote contínuo da eternidade. Quando, muitos anos depois, li uma poesia americana, creio que de Longfellow, e topei este famoso estribilho: Never, for ever! - For ever, never! confesso-lhes que tive um calafrio: recordeime daqueles dias medonhos. Era justamente assim que fazia o relógio da tia Marcolina: - Never, for ever!- For ever, never! Não eram golpes de pêndula, era um diálogo do abismo, um cochicho do nada. E então de noite! Não que a noite fosse mais silenciosa. O silêncio era o mesmo que de dia. Mas a noite era a sombra, era a solidão ainda mais estreita, ou mais larga. Tic-tac, tic-tac. Ninguém, nas salas, na varanda, nos corredores, no terreiro, ninguém em parte nenhuma... Riem-se?
       - Sim, parece que tinha um pouco de medo.
       - Oh! fora bom se eu pudesse ter medo! Viveria. Mas o característico daquela situação é que eu nem sequer podia ter medo, isto é, o medo vulgarmente entendido. Tinha uma sensação inexplicável. Era como um defunto andando, um sonâmbulo, um boneco mecânico. Dormindo, era outra coisa. O sono dava-me alívio, não pela razão comum de ser irmão da morte, mas por outra. Acho que posso explicar assim esse fenômeno: - o sono, eliminando a necessidade de uma alma exterior, deixava atuar a alma interior. Nos sonhos, fardava-me orgulhosamente, no meio da família e dos amigos, que me elogiavam o garbo, que me chamavam alferes; vinha um amigo de nossa casa, e prometia-me o posto de tenente, outro o de capitão ou major; e tudo isso fazia-me viver. Mas quando acordava, dia claro, esvaía-se com o sono a consciência do meu ser novo e único -porque a alma interior perdia a ação exclusiva, e ficava dependente da outra, que teimava em não tornar... Não tornava. Eu saía fora, a um lado e outro, a ver se descobria algum sinal de regresso. Soeur Anne, soeur Anne, ne vois-tu rien venir? Nada, coisa nenhuma; tal qual como na lenda
francesa. Nada mais do que a poeira da estrada e o capinzal dos morros. Voltava para casa, nervoso, desesperado, estirava-me no canapé da sala. Tic-tac, tic-tac. Levantava-me, passeava, tamborilava nos vidros das janelas, assobiava. Em certa ocasião lembrei-me de escrever alguma coisa, um artigo político, um romance, uma ode; não escolhi nada definitivamente; sentei-me e tracei no papel algumas palavras e frases soltas, para intercalar no estilo. Mas o estilo, como tia Marcolina, deixava-se estar. Soeur Anne, soeur Anne...
       Coisa nenhuma. Quando muito via negrejar a tinta e alvejar o papel.
       - Mas não comia?
       - Comia mal, frutas, farinha, conservas, algumas raízes tostadas ao fogo, mas suportaria tudo alegremente, se não fora a terrível situação moral em que me achava. Recitava versos, discursos, trechos latinos, liras de Gonzaga, oitavas de Camões, décimas, uma antologia em trinta volumes. As vezes fazia ginástica; outra dava beliscões nas pernas; mas o efeito era só uma sensação física de dor ou de cansaço, e mais nada. Tudo silêncio, um silêncio vasto, enorme, infinito, apenas sublinhado pelo eterno tic-tac da pêndula. Tic-tac, tic-tac...
       - Na verdade, era de enlouquecer.
       - Vão ouvir coisa pior. Convém dizer-lhes que, desde que ficara só, não olhara uma só vez para o espelho. Não era abstenção deliberada, não tinha motivo; era um impulso inconsciente, um receio de achar-me um e dois, ao mesmo tempo, naquela casa solitária; e se tal explicação é verdadeira, nada prova melhor a contradição humana, porque no fim de oito dias deu-me na veneta de olhar para o espelho com o fim justamente de achar-me dois.
        Olhei e recuei. O próprio vidro parecia conjurado com o resto do universo; não me estampou a figura nítida e inteira, mas vaga, esfumada, difusa, sombra de sombra. A realidade das leis físicas não permite negar que o espelho reproduziu-me textualmente, com os mesmos contornos e feições; assim devia ter sido. Mas tal não foi a minha sensação.
       Então tive medo; atribuí o fenômeno à excitação nervosa em que andava; receei ficar mais tempo, e enlouquecer. - Vou-me embora, disse comigo. E levantei o braço com gesto de mau humor, e ao mesmo tempo de decisão, olhando para o vidro; o gesto lá estava, mas disperso, esgaçado, mutilado... Entrei a vestir-me, murmurando comigo, tossindo sem tosse, sacudindo a roupa com estrépito, afligindo-me a frio com os botões, para dizer alguma coisa. De quando em quando, olhava furtivamente para o espelho; a imagem era a mesma difusão de linhas, a mesma decomposição de contornos... Continuei a vestir-me.
       Subitamente por uma inspiração inexplicável, por um impulso sem cálculo, lembrou-me...
       Se forem capazes de adivinhar qual foi a minha idéia...
       - Diga.
      - Estava a olhar para o vidro, com uma persistência de desesperado, contemplando as próprias feições derramadas e inacabadas, uma nuvem de linhas soltas, informes, quando tive o pensamento... Não, não são capazes de adivinhar.
       - Mas, diga, diga.
      - Lembrou-me vestir a farda de alferes. Vesti-a, aprontei-me de todo; e, como estava defronte do espelho, levantei os olhos, e... não lhes digo nada; o vidro reproduziu então a figura integral; nenhuma linha de menos, nenhum contorno diverso; era eu mesmo, o alferes, que achava, enfim, a alma exterior.  Essa alma ausente com a dona do sítio, dispersa e fugida com os escravos, ei-la recolhida no espelho. Imaginai um homem que, pouco a pouco, emerge de um letargo, abre os olhos sem ver, depois começa a ver, distingue as pessoas dos objetos, mas não conhece individualmente uns nem outros; enfim, sabe que este é Fulano, aquele é Sicrano; aqui está uma cadeira, ali um sofá. Tudo volta ao que era antes do sono.   Assim foi comigo. Olhava para o espelho, ia de um lado para outro, recuava, gesticulava, sorria e o vidro exprimia tudo. Não era mais um autômato, era um ente animado. Daí em diante, fui outro. Cada dia, a uma certa hora, vestia-me de alferes, e sentava-me diante do espelho, lendo olhando, meditando; no fim de duas, três horas, despia-me outra vez. Com este regime pude atravessar mais seis dias de solidão sem os
sentir...
       Quando os outros voltaram a si, o narrador tinha descido as escadas.
FIM

ASSIS, Machado de. Obra Completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar 1994. v. II.

Agora responda no caderno:

1.     O título do conto é “O espelho”. Que outro título ele poderia ter?

2.     Os contos, além de mostrar como são os personagens fisicamente, mostram também seu modo de ser, isto é, como são psicologicamente. Como as personagens são caracterizadas? Justifique sua resposta com uma passagem do texto.

3.     Qual foi o desfecho do conto? Explique.
Observação: A forma como o autor de um texto organiza a sequência de acontecimentos ou ações que constituem a narrativa chama-se enredo. Essas ações podem ser narradas em ordem linear, de acordo com a  sequência cronológica dos fatos, ou em ordem não linear, caso os fatos sejam revelados ao leitor em outra sequência.

    4.     As ações do conto “Palavras aladas” são narradas em ordem linear ou não linear? Justifique.
       5.     Qual é o principal conflito do conto?
       6.     Qual é o momento de mais tensão, de mais emoção no conto?
       7.     Transcreva do conto três palavras ou expressões que marcam a sequência temporal na narrativa.
       8.     Em que espaço a história acontece? Justifique
       9.     Identifique no conto lido, os seguintes elementos:
a)    Personagens: Características físicas e psicológicas:
b)    Espaço (descrição do cenário):
c)    Tempo em que é narrado ou acontece a história:
d)    Foco narrativo, entre outros elementos estruturais que compõem o conto.
10.     Qual a principal temática do conto? Justifique sua resposta com passagens do texto.

Atividade 2 – Poema: Leitura, análise e interpretação.

Leia o poema a seguir:
Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?
Cecília Meireles , Antologia Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.

Agora responda no caderno:
1. Observe a estrutura do poema.
a) Quantas estrofes tem?
b) Quantos versos tem?
c) Há rimas no poema? Dê exemplos.
2. Qual a temática do poema?
3. como o eu-lírico se descreve?
4. Por se tratar de um poema descritivo, o eu-lirico usa predominantemente os adjetivos. Identifique-os escreva 5(cinco).
5. Escreva uma síntese sobre a relação que há entre o conto “O espelho” de Machado de Assis com poema “Retrato” de Cecília Meireles.

Atividade 3 – Leitura e análise de texto

O texto abaixo servirá de base para responder às questões de 1 a 5.
       Tecnologias que importam para a educação são tecnologias de linguagem. A primeira tecnologia de linguagem é o aparelho fonador, que se instalou em nosso próprio corpo por uma questão de sobrevivência adaptativa da espécie humana. Era essa tecnologia que se empregava nas sociedades tribais para a transmissão das narrativas necessárias à preservação de suas culturas. Um grande avanço se deu com a implantação do alfabeto no mundo grego, quando se instaurou a escrita no mundo ocidental.  É devido a isso que estamos lendo os gregos até hoje.
       Outro avanço ocorreu com a invenção da prensa manual de Gutenberg (em meados do século XV), que possibilitou a criação disto que passamos a chamar de livro: linguagem impressa em folhas sequenciais de papel encadernado. A explosão do livro viria com a revolução industrial no século XIX, que permitiu a aceleração da impressão em máquinas rotatórias. Foi também no século XIX que surgiu o modelo de escola que atravessou uma boa parte do século XX, um modelo cada vez mais adaptado ao desenvolvimento de competências e especializações para atender às necessidades do mercado de trabalho capitalista. Trata-se de um modelo escolar baseado na atomização dos campos do conhecimento e centrado no saber do professor e na transmissão desse saber por meio de exposições orais e livros-textos.
       Com o advento do rádio e da televisão, que são meios não apenas noticiosos, mas, sobretudo, de entretenimento, a escola e especialmente o livro começaram a sofrer a competição dessas tecnologias de linguagem mais rápidas e mais afeitas a repertórios de informação médios, inclusive acessíveis a pessoas de baixa escolaridade. Essa competição não chegou a abalar o modelo escolar vigente. Ambos passaram a conviver em paralelo. Foi essa época que viu nascerem processos de ensino complementares via TV educativa, com eficácia bastante discutível. Foi só a partir dos anos 1990, quando a cultura do computador passou a cada vez mais fazer parte da vida da sociedade em geral, que surgiriam as grandes revoluções nas tecnologias de linguagem, com o manancial de desafios que estão trazendo para os modelos tradicionais de educação.
      [...] Hoje, a educação formal, aquela que se desenvolve nas escolas, tem de aprender a conviver e criar estratégias de complementaridade com aquilo que chamo de aprendizagem ubíqua (SANTAELLA, 2013). É um tipo de aprendizagem que, para obtermos, basta ter um celular nas mãos. Qualquer curiosidade acerca de qualquer tema pode ser saciada instantaneamente, sem a presença de nenhum mestre. Além disso, uma vez que os equipamentos móveis estão também conectados a redes de relacionamento, pode-se contar com a colaboração de amigos mais sabidos sobre o assunto quando surgem dúvidas. Já existem projetos para incorporar esse tipo de aprendizagem aos planejamentos da educação formal. Isso não significa que a escola deva abdicar de suas estruturas mais sistemáticas de aprendizagem, confiando à aprendizagem ubíqua tarefas que não podem deixar de ser suas.
       As novas tecnologias estão aí para enriquecer os processos de aprendizagem. Estamos em época de somar e não de diminuir. Ademais, é preciso levar em conta que a aprendizagem ubíqua é dispersiva, descontínua. Se ela não for complementada com processos mais sistemáticos, ninguém se especializa em coisa nenhuma.
Disponível em: http://www.plataformadoletramento.org.br/em-revista-entrevista-detalhe/651/lucia-santaella-as-novas-linguagens-e-a-educacao.html. [Texto adaptado de entrevista]. Acesso em: 13 fev. 2020.

Agora responda no caderno:

1. O objetivo predominante do texto é
a) defender o uso das tecnologias na educação como recurso mais viável de aprendizagem do que a educação formal.
b) descrever as tecnologias da linguagem presentes na atualidade e responsáveis por uma educação ubíqua.
c) historicizar as tecnologias da linguagem desde as sociedades tribais até os equipamentos móveis da atualidade.
d) explicar como a educação ubíqua pode gerar conhecimento mais sistematizado do que as estratégias convencionais de educação.

2. Considerando os dois primeiros parágrafos, é correto afirmar:
a)  a interligação do segundo parágrafo ao primeiro é estabelecida por meio da expressão “outro avanço”.
b)  a interligação do segundo parágrafo ao primeiro é estabelecida por meio do apagamento de um termo.
c) o segundo parágrafo relaciona-se, coerentemente, com o primeiro devido ao uso de um marcador temporal.
d) o modelo de escola e a escrita são apresentados, paralelisticamente, nos dois primeiros parágrafos, como grandes marcos da tecnologia de linguagem.

3. No último parágrafo, a palavra “ubíqua” pode ser substituída, sem alteração de sentido, por
a) igualitária.
b) onipresente.
c) democrática.
d) restrita.

4. Assinale a alternativa que corresponde a tipologia do texto lido:
a) Narrrativo
b) Dissertativo/argumentativo
c) Prescritivo/Injuntivo
d) Descritivo
e) Informativo

5. Que tipo de linguagem predomina no texto?
a) Formal
b) Informal
c) Técnica
d) Jurídica

Atividade 4 – Produção Textual
PROPOSTA DE PRODUÇÃO TEXTUAL
       Com base em seus conhecimentos prévios sobre essa temática, produza um texto argumentativo no qual você assuma um posicionamento, fundamentado em evidências e argumentos sólidos, sobre a questão abaixo.
Em que medida o uso da tecnologia impacta, em sala de aula, a aprendizagem de estudantes do ensino fundamental?

INSTRUÇÕES
Seu texto deverá, obrigatoriamente, atender as seguintes exigências: 
Ø  ser redigido no caderno; 
Ø  apresentar, explicitamente, um ponto de vista em relação à questão-tema; 
Ø  ser redigido na variedade padrão da língua portuguesa; 
Ø  não ser escrito em versos; 
Ø  conter, no máximo, 30 linhas; 
Ø  respeitar as normas de citação de textos; 
Ø  não ser assinado (nem mesmo com pseudônimo).
ATENÇÃO
Será atribuída NOTA ZERO à redação em qualquer um dos seguintes casos: 
Ø  texto com até 14 linhas; 
Ø  fuga ao tema ou à proposta; 
Ø  letra ilegível; 
Ø  identificação do aluno (nome, assinatura ou pseudônimo); 
Ø texto que revele desrespeito aos direitos humanos ou que sejam ofensivos. 






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