3ª Série do Ensino Médio
Atividades de Língua Portuguesa
Professora Elaine Cristina
ATIVIDADE DE
LINGUA PORTUGUESA EM CARÁTER EXTRAORDINÁRIO - 1º BIMESTRE/20
Atividade 1 – Conto: Leitura, análise e interpretação
Leia
o conto a seguir:
O
espelho
Esboço
de uma nova teoria da alma humana
Quatro ou cinco cavalheiros debatiam, uma noite, várias questões de alta
transcendência, sem que a disparidade dos votos trouxesse a menor alteração aos
espíritos. A casa ficava no morro de Santa Teresa, a sala era pequena, alumiada
a velas, cuja luz fundia-se misteriosamente com o luar que vinha de fora. Entre a cidade, com as suas agitações e aventuras,
e o céu, em que as estrelas pestanejavam, através de uma atmosfera límpida e sossegada,
estavam os nossos quatro ou cinco investigadores de coisas metafísicas, resolvendo
amigavelmente os mais árduos problemas do universo.
Por que quatro ou cinco? Rigorosamente eram quatro os que falavam; mas,
além deles, havia na sala um quinto personagem, calado, pensando, cochilando,
cuja espórtula no debate não passava de um ou outro resmungo de aprovação. Esse
homem tinha a mesma idade dos companheiros, entre quarenta e cinqüenta anos,
era provinciano, capitalista, inteligente, não sem instrução, e, ao que parece,
astuto e cáustico. Não discutia nunca; e defendia-se da abstenção com um
paradoxo, dizendo que a discussão é a forma polida do instinto batalhador, que
jaz no homem, como uma herança bestial; e acrescentava que os serafins e os
querubins não controvertiam nada, e, aliás, eram a perfeição espiritual e eterna.
Como desse esta mesma resposta naquela noite, contestou-lha um dos presentes, e
desafiou-o a demonstrar o que dizia, se era capaz. Jacobina (assim se chamava
ele) refletiu um instante, e respondeu:
- Pensando bem, talvez o senhor tenha razão.
Vai senão quando, no meio da noite, sucedeu que este casmurro usou da
palavra, e não dois ou três minutos, mas trinta ou quarenta. A conversa, em
seus meandros, veio a cair na natureza da alma, ponto que dividiu radicalmente
os quatro amigos. Cada cabeça, cada sentença; não só o acordo, mas a mesma
discussão tornou-se difícil, senão impossível, pela multiplicidade das questões
que se deduziram do tronco principal e um pouco, talvez, pela inconsistência
dos pareceres. Um dos argumentadores pediu ao Jacobina alguma opinião, - uma
conjetura, ao menos.
- Nem conjetura, nem opinião, redargüiu ele; uma ou outra pode dar lugar
a dissentimento, e, como sabem, eu não discuto. Mas, se querem ouvir-me
calados, posso contar-lhes um caso de minha vida, em que ressalta a mais clara
demonstração acerca da matéria de que se trata. Em primeiro lugar, não há uma
só alma, há duas...
- Duas?
- Nada menos de duas almas. Cada criatura humana traz duas almas
consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para entro...
Espantem-se à vontade, podem ficar de boca aberta, dar de ombros, tudo; não
admito réplica. Se me replicarem, acabo o charuto e vou dormir. A alma exterior
pode ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto, uma
operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma
exterior de uma pessoa; - e assim também a polca, o voltarete, um livro, uma máquina,
um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc. Está claro que o ofício dessa segunda
alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o homem, que é, metafisicamente
falando, uma laranja. Quem perde uma das metades, perde naturalmente metade da
existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior implica a da
existência inteira. Shylock, por exemplo. A alma exterior aquele judeu eram os
seus ducados; perdê-los equivalia a morrer. "Nunca mais verei o meu ouro,
diz ele a Tubal; é um punhal que me enterras no coração." Vejam bem
esta frase; a perda dos ducados, alma exterior, era a morte para ele. Agora, é
preciso saber que a alma exterior não é sempre a mesma...
- Não?
- Não, senhor; muda de natureza e de estado. Não aludo a certas almas
absorventes, como a pátria, com a qual disse o Camões que morria, e o poder,
que foi a alma exterior de César e de Cromwell. São almas enérgicas e
exclusivas; mas há outras, embora enérgicas, de natureza mudável. Há cavalheiros,
por exemplo, cuja alma exterior, nos primeiros anos, foi um chocalho ou um
cavalinho de pau, e mais tarde uma provedoria de irmandade, suponhamos. Pela
minha parte, conheço uma senhora, - na verdade, gentilíssima, - que muda de
alma exterior cinco, seis vezes por ano. Durante a estação lírica é a ópera; cessando
a estação, a alma exterior substitui-se por outra: um concerto, um baile do Cassino,
a rua do Ouvidor, Petrópolis...
- Perdão; essa senhora quem é?
- Essa senhora é parenta do diabo, e tem o mesmo nome; chama-se
Legião... E assim outros mais casos. Eu mesmo tenho experimentado dessas
trocas. Não as relato, porque iria longe; restrinjo-me ao episódio de que lhes
falei. Um episódio dos meus vinte e cinco anos...
Os quatro companheiros, ansiosos de ouvir o caso prometido, esqueceram a
controvérsia.
Santa curiosidade! tu não és só a alma da civilização, és também o pomo
da concórdia, fruta divina, de outro sabor que não aquele pomo da mitologia. A
sala, até há pouco ruidosa de física e metafísica, é agora um mar morto; todos
os olhos estão no Jacobina, que conserta a ponta do charuto, recolhendo as
memórias. Eis aqui como ele começou a narração:
- Tinha vinte e cinco anos, era pobre, e acabava de ser nomeado alferes
da Guarda Nacional. Não imaginam o acontecimento que isto foi em nossa casa.
Minha mãe ficou tão orgulhosa! tão contente! Chamava-me o seu alferes. Primos e tios, foi
tudo uma alegria sincera e pura. Na vila, note-se bem, houve alguns
despeitados; choro e ranger de dentes, como na Escritura; e o motivo não foi
outro senão que o posto tinha muitos candidatos e que esses perderam. Suponho
também que uma parte do desgosto foi inteiramente gratuita: nasceu da simples
distinção. Lembra-me de alguns rapazes, que se davam comigo, e passaram a
olhar-me de revés, durante algum tempo. Em compensação, tive muitas pessoas que
ficaram satisfeitas com a nomeação; e a prova é que todo o fardamento me foi
dado por amigos... Vai então uma das minhas tias, D. Marcolina, viúva do
Capitão Peçanha, que morava a muitas léguas da vila, num sítio escuso e
solitário, desejou ver-me, e pediu que fosse ter com ela e levasse a farda.
Fui, acompanhado de um pajem, que daí a dias tornou à vila, porque a tia
Marcolina, apenas me pilhou no sítio, escreveu a minha mãe dizendo que não me
soltava antes de um mês, pelo menos. E abraçava-me! Chamava-me também o seu alferes.
Achava-me um rapagão bonito. Como era um tanto patusca, chegou a confessar que tinha
inveja da moça que houvesse de ser minha mulher. Jurava que em toda a província
não havia outro que me pusesse o pé
adiante. E sempre alferes; era alferes para cá, alferes para lá, alferes a toda
a hora. Eu pedia-lhe que me chamasse Joãozinho, como dantes; e ela abanava a
cabeça, bradando que não, que era o "senhor alferes". Um cunhado
dela, irmão do finado Peçanha, que ali morava, não me chamava de outra maneira.
Era o "senhor alferes", não por gracejo, mas a sério, e à vista dos
escravos, que naturalmente foram pelo mesmo caminho. Na mesa tinha eu o melhor
lugar, e era o primeiro servido. Não imaginam. Se lhes disser que o entusiasmo
da tia Marcolina chegou ao ponto de mandar pôr no meu quarto um grande espelho,
obra rica e magnífica, que destoava do resto da casa, cuja mobília era modesta e
simples... Era um espelho que lhe dera a madrinha, e que esta herdara da mãe,
que o comprara a uma das fidalgas vindas em 1808 com a corte de D. João VI. Não
sei o que havia nisso de verdade; era a tradição. O espelho estava naturalmente
muito velho; mas via-se-lhe ainda o ouro, comido em parte pelo tempo, uns
delfins esculpidos nos ângulos superiores da moldura, uns enfeites de
madrepérola e outros caprichos do artista. Tudo velho, mas bom...
- Espelho grande?
- Grande. E foi, como digo, uma enorme fineza, porque o espelho estava
na sala; era a melhor peça da casa. Mas não houve forças que a demovessem do
propósito; respondia que não fazia falta, que era só por algumas semanas, e
finalmente que o "senhor alferes" merecia muito mais. O certo é que
todas essas coisas, carinhos, atenções, obséquios, fizeram em mim uma
transformação, que o natural sentimento da mocidade ajudou e completou.
Imaginam, creio eu?
- Não.
- O alferes eliminou o homem. Durante
alguns dias as duas naturezas equilibraram-se; mas não tardou que a primitiva
cedesse à outra; ficou-me uma parte mínima de humanidade.
Aconteceu então que a alma exterior, que era dantes o sol, o ar, o
campo, os olhos das moças, mudou de natureza, e passou a ser a cortesia e os
rapapés da casa, tudo o que me falava do posto, nada do que me falava do homem.
A única parte do cidadão que ficou comigo foi aquela que entendia com o
exercício da patente; a outra dispersou-se no ar e no passado. Custa-lhes
acreditar, não?
- Custa-me até entender, respondeu um dos ouvintes.
- Vai entender. Os fatos explicarão melhor os sentimentos: os fatos são
tudo. A melhor definição do amor não vale um beijo de moça namorada; e, se bem
me lembro, um filósofo antigo demonstrou o movimento andando. Vamos aos fatos.
Vamos ver como, ao tempo em que a consciência do homem se obliterava, a do
alferes tornava-se viva e intensa. As dores humanas, as alegrias humanas, se
eram só isso, mal obtinham de mim uma compaixão apática ou um sorriso de favor.
No fim de três semanas, era outro, totalmente outro. Era exclusivamente
alferes. Ora, um dia recebeu a tia Marcolina uma notícia grave; uma de suas
filhas, casada com um lavrador residente dali a cinco léguas, estava mal e à
morte.
Adeus, sobrinho! adeus, alferes! Era mãe extremosa, armou logo uma
viagem, pediu ao cunhado que fosse com ela, e a mim que tomasse conta do sítio.
Creio que, se não fosse a aflição, disporia o contrário; deixaria o cunhado e
iria comigo. Mas o certo é que fiquei só, com os poucos escravos da casa.
Confesso-lhes que desde logo senti uma grande opressão, alguma coisa semelhante
ao efeito de quatro paredes de um cárcere, subitamente levantadas em torno de
mim. Era a alma exterior que se reduzia; estava agora limitada a alguns espíritos
boçais. O alferes continuava a dominar em mim, embora a vida fosse menos intensa,
e a consciência mais débil. Os escravos punham uma nota de humildade nas suas cortesias,
que de certa maneira compensava a afeição dos parentes e a intimidade doméstica
interrompida. Notei mesmo, naquela noite, que eles redobravam de respeito, de
alegria, de protestos. Nhô alferes, de minuto a minuto; nhô alferes é muito
bonito; nhô alferes há de ser coronel; nhô alferes há de casar com moça bonita,
filha de general; um concerto de louvores e profecias, que me deixou extático.
Ah ! pérfidos! mal podia eu suspeitar a intenção secreta dos malvados.
- Matá-lo?
- Antes assim fosse.
- Coisa pior?
- Ouçam-me. Na manhã seguinte achei-me só. Os velhacos, seduzidos por
outros, ou de movimento próprio, tinham resolvido fugir durante a noite; e
assim fizeram. Achei-me só, sem mais ninguém, entre quatro paredes, diante do
terreiro deserto e da roça abandonada.
Nenhum fôlego humano. Corri a casa toda, a senzala, tudo; ninguém, um
molequinho que fosse. Galos e galinhas
tão-somente, um par de mulas, que filosofavam a vida, sacudindo as moscas, e
três bois. Os mesmos cães foram levados
pelos escravos. Nenhum ente humano.
Parece-lhes que isto era melhor do que ter morrido? era pior. Não por
medo; juro-lhes que não tinha medo; era um pouco atrevidinho, tanto que não
senti nada, durante as primeiras horas. Fiquei triste por causa do dano causado
à tia Marcolina; fiquei também um pouco perplexo, não sabendo se devia ir ter
com ela, para lhe dar a triste notícia, ou ficar tomando conta da casa. Adotei
o segundo alvitre, para não desamparar a casa, e porque, se a minha prima
enferma estava mal, eu ia somente aumentar a dor da mãe, sem remédio nenhum; finalmente,
esperei que o irmão do tio Peçanha voltasse naquele dia ou no outro, visto que tinha
saído havia já trinta e seis horas. Mas a manhã passou sem vestígio dele; à
tarde comecei a sentir a sensação como de pessoa que houvesse perdido toda a
ação nervosa, e não tivesse consciência da ação muscular. O irmão do tio
Peçanha não voltou nesse dia, nem no outro, nem em toda aquela semana. Minha
solidão tomou proporções enormes.
Nunca os dias foram mais compridos, nunca o sol abrasou a terra com uma
obstinação mais cansativa. As horas batiam de século a século no velho relógio
da sala, cuja pêndula tic-tac, tic-tac, feria-me a alma interior,
como um piparote contínuo da eternidade. Quando, muitos anos depois, li uma
poesia americana, creio que de Longfellow, e topei este famoso estribilho: Never,
for ever! - For ever, never! confesso-lhes que tive um calafrio: recordeime
daqueles dias medonhos. Era justamente assim que fazia o relógio da tia
Marcolina: - Never, for ever!- For ever, never! Não eram golpes de
pêndula, era um diálogo do abismo, um cochicho do nada. E então de noite! Não
que a noite fosse mais silenciosa. O silêncio era o mesmo que de dia. Mas a
noite era a sombra, era a solidão ainda mais estreita, ou mais larga. Tic-tac,
tic-tac. Ninguém, nas salas, na varanda, nos corredores, no terreiro, ninguém
em parte nenhuma... Riem-se?
- Sim, parece que tinha um pouco de medo.
- Oh! fora bom se eu pudesse ter medo! Viveria. Mas o característico
daquela situação é que eu nem sequer podia ter medo, isto é, o medo vulgarmente
entendido. Tinha uma sensação inexplicável. Era como um defunto andando, um
sonâmbulo, um boneco mecânico. Dormindo, era outra coisa. O sono dava-me
alívio, não pela razão comum de ser irmão da morte, mas por outra. Acho que
posso explicar assim esse fenômeno: - o sono, eliminando a necessidade de uma
alma exterior, deixava atuar a alma interior. Nos sonhos, fardava-me
orgulhosamente, no meio da família e dos amigos, que me elogiavam o garbo, que
me chamavam alferes; vinha um amigo de nossa casa, e prometia-me o posto de tenente,
outro o de capitão ou major; e tudo isso fazia-me viver. Mas quando acordava,
dia claro, esvaía-se com o sono a consciência do meu ser novo e único -porque a
alma interior perdia a ação exclusiva, e ficava dependente da outra, que
teimava em não tornar... Não tornava. Eu saía fora, a um lado e outro, a ver se
descobria algum sinal de regresso. Soeur Anne, soeur Anne, ne vois-tu rien
venir? Nada, coisa nenhuma; tal qual como na lenda
francesa. Nada mais do que a poeira da
estrada e o capinzal dos morros. Voltava para casa, nervoso, desesperado,
estirava-me no canapé da sala. Tic-tac, tic-tac. Levantava-me, passeava,
tamborilava nos vidros das janelas, assobiava. Em certa ocasião lembrei-me de escrever
alguma coisa, um artigo político, um romance, uma ode; não escolhi nada definitivamente;
sentei-me e tracei no papel algumas palavras e frases soltas, para intercalar no
estilo. Mas o estilo, como tia Marcolina, deixava-se estar. Soeur Anne,
soeur Anne...
Coisa nenhuma. Quando muito via negrejar a tinta e alvejar o papel.
- Mas não comia?
- Comia mal, frutas, farinha, conservas, algumas raízes tostadas ao
fogo, mas suportaria tudo alegremente, se não fora a terrível situação moral em
que me achava. Recitava versos, discursos, trechos latinos, liras de Gonzaga,
oitavas de Camões, décimas, uma antologia em trinta volumes. As vezes fazia
ginástica; outra dava beliscões nas pernas; mas o efeito era só uma sensação
física de dor ou de cansaço, e mais nada. Tudo silêncio, um silêncio vasto, enorme,
infinito, apenas sublinhado pelo eterno tic-tac da pêndula. Tic-tac,
tic-tac...
- Na verdade, era de enlouquecer.
- Vão ouvir coisa pior. Convém dizer-lhes que, desde que ficara só, não
olhara uma só vez para o espelho. Não era abstenção deliberada, não tinha
motivo; era um impulso inconsciente, um receio de achar-me um e dois, ao mesmo
tempo, naquela casa solitária; e se tal explicação é verdadeira, nada prova
melhor a contradição humana, porque no fim de oito dias deu-me na veneta de
olhar para o espelho com o fim justamente de achar-me dois.
Olhei e recuei. O próprio vidro parecia conjurado com o resto do
universo; não me estampou a figura nítida e inteira, mas vaga, esfumada,
difusa, sombra de sombra. A realidade das leis físicas não permite negar que o
espelho reproduziu-me textualmente, com os mesmos contornos e feições; assim
devia ter sido. Mas tal não foi a minha sensação.
Então tive medo; atribuí o fenômeno à excitação nervosa em que andava;
receei ficar mais tempo, e enlouquecer. - Vou-me embora, disse comigo. E
levantei o braço com gesto de mau humor, e ao mesmo tempo de decisão, olhando
para o vidro; o gesto lá estava, mas disperso, esgaçado, mutilado... Entrei a
vestir-me, murmurando comigo, tossindo sem tosse, sacudindo a roupa com
estrépito, afligindo-me a frio com os botões, para dizer alguma coisa. De
quando em quando, olhava furtivamente para o espelho; a imagem era a mesma
difusão de linhas, a mesma decomposição de contornos... Continuei a vestir-me.
Subitamente por uma inspiração
inexplicável, por um impulso sem cálculo, lembrou-me...
Se forem capazes de adivinhar qual foi a minha idéia...
- Diga.
- Estava a olhar para o vidro, com uma persistência de desesperado,
contemplando as próprias feições derramadas e inacabadas, uma nuvem de linhas
soltas, informes, quando tive o pensamento... Não, não são capazes de
adivinhar.
- Mas, diga, diga.
- Lembrou-me vestir a farda de alferes. Vesti-a, aprontei-me de todo; e,
como estava defronte do espelho, levantei os olhos, e... não lhes digo nada; o
vidro reproduziu então a figura integral; nenhuma linha de menos, nenhum
contorno diverso; era eu mesmo, o alferes, que achava, enfim, a alma exterior. Essa alma ausente com a dona do sítio,
dispersa e fugida com os escravos, ei-la recolhida no espelho. Imaginai um
homem que, pouco a pouco, emerge de um letargo, abre os olhos sem ver, depois
começa a ver, distingue as pessoas dos objetos, mas não conhece individualmente
uns nem outros; enfim, sabe que este é Fulano, aquele é Sicrano; aqui está uma
cadeira, ali um sofá. Tudo volta ao que era antes do sono. Assim foi comigo. Olhava para o espelho, ia
de um lado para outro, recuava, gesticulava, sorria e o vidro exprimia tudo.
Não era mais um autômato, era um ente animado. Daí em diante, fui outro. Cada
dia, a uma certa hora, vestia-me de alferes, e sentava-me diante do espelho,
lendo olhando, meditando; no fim de duas, três horas, despia-me outra vez. Com
este regime pude atravessar mais seis dias de solidão sem os
sentir...
Quando os outros voltaram a si, o narrador tinha descido as escadas.
FIM
ASSIS, Machado de. Obra Completa. Rio de
Janeiro: Nova Aguilar 1994. v. II.
Agora responda no caderno:
1.
O título do conto é “O espelho”. Que outro título ele poderia
ter?
2.
Os contos, além de mostrar como são os personagens fisicamente,
mostram também seu modo de ser, isto é, como são psicologicamente. Como as
personagens são caracterizadas? Justifique sua resposta com uma passagem do
texto.
3.
Qual foi o desfecho do conto? Explique.
Observação: A forma como o autor de um texto organiza a
sequência de acontecimentos ou ações que constituem a narrativa chama-se enredo. Essas ações podem ser narradas
em ordem linear, de acordo com
a sequência cronológica dos fatos, ou em
ordem não linear, caso os fatos
sejam revelados ao leitor em outra sequência.
4.
As ações do conto “Palavras aladas” são narradas em ordem linear
ou não linear? Justifique.
5.
Qual é o principal conflito do conto?
6.
Qual é o momento de mais
tensão, de mais emoção no conto?
7.
Transcreva do conto três
palavras ou expressões que marcam a sequência temporal na narrativa.
8.
Em que espaço a história
acontece? Justifique
9.
Identifique no conto lido,
os seguintes elementos:
a) Personagens: Características físicas e psicológicas:
b)
Espaço (descrição do cenário):
c)
Tempo em que é narrado ou acontece a história:
d)
Foco narrativo, entre outros elementos estruturais que compõem o conto.
10.
Qual a principal temática do conto? Justifique sua resposta com
passagens do texto.
Atividade 2 – Poema: Leitura, análise e interpretação.
Leia o poema a seguir:
Retrato
Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?
Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?
Cecília Meireles , Antologia Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.
Agora responda no caderno:
1. Observe a estrutura do poema.
a) Quantas estrofes tem?
b) Quantos versos tem?
c) Há rimas no poema? Dê exemplos.
2. Qual a temática do poema?
3. como o eu-lírico se descreve?
4. Por se tratar de um poema descritivo,
o eu-lirico usa predominantemente os adjetivos. Identifique-os escreva
5(cinco).
5. Escreva uma síntese sobre a
relação que há entre o conto “O espelho” de Machado de Assis com poema
“Retrato” de Cecília Meireles.
Atividade 3 – Leitura e análise de texto
O texto abaixo servirá de base para
responder às questões de 1 a 5.
Tecnologias que importam para a educação
são tecnologias de linguagem. A primeira tecnologia de linguagem é o aparelho
fonador, que se instalou em nosso próprio corpo por uma questão de
sobrevivência adaptativa da espécie humana. Era essa tecnologia que se
empregava nas sociedades tribais para a transmissão das narrativas necessárias
à preservação de suas culturas. Um grande avanço se deu com a implantação do
alfabeto no mundo grego, quando se instaurou a escrita no mundo ocidental. É devido a isso que estamos lendo os gregos
até hoje.
Outro avanço ocorreu com a invenção da
prensa manual de Gutenberg (em meados do século XV), que possibilitou a criação
disto que passamos a chamar de livro: linguagem impressa em folhas sequenciais
de papel encadernado. A explosão do livro viria com a revolução industrial no
século XIX, que permitiu a aceleração da impressão em máquinas rotatórias. Foi
também no século XIX que surgiu o modelo de escola que atravessou uma boa parte
do século XX, um modelo cada vez mais adaptado ao desenvolvimento de competências
e especializações para atender às necessidades do mercado de trabalho
capitalista. Trata-se de um modelo escolar baseado na atomização dos campos do
conhecimento e centrado no saber do professor e na transmissão desse saber por
meio de exposições orais e livros-textos.
Com o advento do rádio e da televisão,
que são meios não apenas noticiosos, mas, sobretudo, de entretenimento, a
escola e especialmente o livro começaram a sofrer a competição dessas
tecnologias de linguagem mais rápidas e mais afeitas a repertórios de
informação médios, inclusive acessíveis a pessoas de baixa escolaridade. Essa
competição não chegou a abalar o modelo escolar vigente. Ambos passaram a
conviver em paralelo. Foi essa época que viu nascerem processos de ensino
complementares via TV educativa, com eficácia bastante discutível. Foi só a
partir dos anos 1990, quando a cultura do computador passou a cada vez mais
fazer parte da vida da sociedade em geral, que surgiriam as grandes revoluções
nas tecnologias de linguagem, com o manancial de desafios que estão trazendo
para os modelos tradicionais de educação.
[...] Hoje, a educação formal, aquela que
se desenvolve nas escolas, tem de aprender a conviver e criar estratégias de
complementaridade com aquilo que chamo de aprendizagem ubíqua (SANTAELLA,
2013). É um tipo de aprendizagem que, para obtermos, basta ter um celular nas
mãos. Qualquer curiosidade acerca de qualquer tema pode ser saciada
instantaneamente, sem a presença de nenhum mestre. Além disso, uma vez que os equipamentos
móveis estão também conectados a redes de relacionamento, pode-se contar com a
colaboração de amigos mais sabidos sobre o assunto quando surgem dúvidas. Já
existem projetos para incorporar esse tipo de aprendizagem aos planejamentos da
educação formal. Isso não significa que a escola deva abdicar de suas
estruturas mais sistemáticas de aprendizagem, confiando à aprendizagem ubíqua
tarefas que não podem deixar de ser suas.
As novas tecnologias estão aí para
enriquecer os processos de aprendizagem. Estamos em época de somar e não de
diminuir. Ademais, é preciso levar em conta que a aprendizagem ubíqua é
dispersiva, descontínua. Se ela não for complementada com processos mais
sistemáticos, ninguém se especializa em coisa nenhuma.
Disponível em: http://www.plataformadoletramento.org.br/em-revista-entrevista-detalhe/651/lucia-santaella-as-novas-linguagens-e-a-educacao.html.
[Texto adaptado de entrevista]. Acesso em: 13 fev. 2020.
Agora responda no caderno:
1. O
objetivo predominante do texto é
a) defender
o uso das tecnologias na educação como recurso mais viável de aprendizagem do
que a educação formal.
b) descrever
as tecnologias da linguagem presentes na atualidade e responsáveis por uma
educação ubíqua.
c) historicizar
as tecnologias da linguagem desde as sociedades tribais até os equipamentos
móveis da atualidade.
d) explicar como a educação ubíqua pode
gerar conhecimento mais sistematizado do que as estratégias convencionais de
educação.
2.
Considerando os dois primeiros parágrafos, é correto afirmar:
a) a interligação do segundo parágrafo ao primeiro é
estabelecida por meio da expressão “outro avanço”.
b) a interligação do segundo parágrafo ao primeiro é
estabelecida por meio do apagamento de um termo.
c) o segundo parágrafo
relaciona-se, coerentemente, com o primeiro devido ao uso de um marcador
temporal.
d) o modelo de escola e a escrita são
apresentados, paralelisticamente, nos dois primeiros parágrafos, como grandes
marcos da tecnologia de linguagem.
3. No último parágrafo,
a palavra “ubíqua” pode ser substituída, sem alteração de sentido, por
a) igualitária.
b) onipresente.
c) democrática.
d) restrita.
4. Assinale a alternativa que
corresponde a tipologia do texto lido:
a) Narrrativo
b) Dissertativo/argumentativo
c) Prescritivo/Injuntivo
d) Descritivo
e) Informativo
5. Que tipo de linguagem predomina no
texto?
a) Formal
b) Informal
c) Técnica
d) Jurídica
Atividade 4 – Produção Textual
PROPOSTA DE PRODUÇÃO TEXTUAL
Com base em seus conhecimentos prévios
sobre essa temática, produza um texto argumentativo no qual você assuma
um posicionamento, fundamentado em evidências e argumentos sólidos, sobre a
questão abaixo.
Em que medida o uso da
tecnologia impacta, em sala de aula, a aprendizagem de estudantes do ensino
fundamental?
INSTRUÇÕES
Seu texto deverá, obrigatoriamente, atender as
seguintes exigências:
Ø
ser redigido no caderno;
Ø
apresentar, explicitamente, um ponto de vista em relação à
questão-tema;
Ø
ser redigido na variedade padrão da língua portuguesa;
Ø
não ser escrito em versos;
Ø
conter, no máximo, 30 linhas;
Ø
respeitar as normas de citação de textos;
Ø
não ser assinado (nem mesmo com pseudônimo).
ATENÇÃO
Será atribuída NOTA ZERO à redação em
qualquer um dos seguintes casos:
Ø
texto com até 14 linhas;
Ø
fuga ao tema ou à proposta;
Ø
letra ilegível;
Ø
identificação do aluno (nome, assinatura ou pseudônimo);
Ø texto
que revele desrespeito aos direitos humanos ou que sejam ofensivos.
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